Hidrelétricas no Rio Pardo – A favor ou contra?
“O homem chega já desfaz a natureza, tira gente põe represa diz que tudo vai mudar.”
A emblemática música “Sobradinho”, de Sá e Guarabira, ilustra a situação atual vivida por nossa região do Rio Pardo, rio localizado na bacia hidrográfica do Médio Paranapanema, na divisa com o Norte do Paraná. O tema das hidrelétricas com certeza vai se estender por muito tempo. E quanto mais ele se estende, enchentes de questionamentos vão surgindo. E somente assim, com um tempo para estudar, analisar, pensar e ponderar, é que podemos ter uma postura séria frente a um tema tão complexo.
Temos de ter a brandura das águas do paradão do Rio Pardo para analisar com calma as consequências do que vai acontecer no futuro. Mas também temos de ter a tenacidade das águas, as quais transpõem os obstáculos dos saltos, para não parar nosso entendimento em explicações simplórias que atentam contra nossa liberdade de expressão e nossa autonomia de ação perante nosso futuro.
Do lado da defesa da construção, temos a tese da necessidade da geração de energia, a qual está em falta no mercado. Energia que é necessária para sustentar o desenvolvimento do Brasil, que pretende ser uma economia pujante no futuro. Aliado a isso, argumenta-se que as hidrelétricas criarão empregos e aumentarão a arrecadação dos impostos. Numa primeira visão, os pontos são irrefutáveis e seria inconcebível uma posição contrária.
Por outro lado, a cada dia, as questões primárias (a destruição de belezas naturais das cachoeiras, do habitat das espécies animais que vivem à beira do Rio Pardo e o sentimento de perda de muitos) que foram apresentadas inicialmente em defesa da não construção das usinas, são engrossadas por outras questões que saem do foco do meio ambiente e se aprofundam no âmbito dos impactos econômicos e sociais.
Com isso avolumam-se os pontos contrários, sendo necessário mais tempo para se analisar e se pedir mais respostas e estudos para as dúvidas que aparecem.E esse aumento de prazo, para a análise do EIA-RIMA (estudo de 3 mil páginas apresentado pelos investidores do empreendimento, Hidrotérmica S.A. e Ecopart Investimentos S/A), é que foi objeto do pedido de várias entidades e particulares que encaminharam ofícios ao Secretário de Meio Ambiente do Estado de São Paulo.
Nos ofícios encaminhados foram questionados 36 pontos de discordância com os estudos apresentados. Referente aos impactos ambientais foram citados, entre outros: a questão do tempo de plantio das matas ciliares e o alojamento da fauna neste período; a não observância da diversidade do plantio das novas matas; a não observância do tempo de recuperação do ecossistema e a deficiência do estudo na identificação de muitas das espécies animais que vivem nas margens do rio. Quanto aos impactos econômicos foram questionados: o destino do ganho financeiro da venda das árvores derrubadas nos locais de alagamento; a falta de explicação da superavaliação (em torno de 100%) da geração da energia das hidrelétricas em relação aos estudos da ANEEL; a não observância no aumento da insegurança do produtor rural e o impacto na produtividade; a falta de avaliação de outras fontes de energia da região; a inexistência da avaliação do impacto do desemprego devido ao alagamento de áreas produtivas, tanto dos trabalhadores como dos proprietários que perderem a totalidade de suas terras; a não avaliação do impacto fiscal da diminuição de áreas produtivas; o não esclarecimento no futuro local de construção de pontes que serão destruídas e também a inexistência dos impactos causados na captação de água e nas água medicinais de Águas de Santa Bárbara. No campo dos impactos sociais,a não apresentação de estudos sobre a qualidade da água para consumo após a instalação das usinas e seus reflexos para a população. Também não foram apresentados os reais retornos de impostos, e a geração de empregos não passa de 200 por usina, pelo período de 2 anos, e de 8 empregos diretos por unidade para a operação e nenhum indireto.
Aliado a tudo isso, nesta semana em reportagem no jornal Novo Negocião, o Superintendente do SAE (Sistema de água e esgoto) de Ourinhos, Haroldo Adílson Maranho, posicionou-se contrário à construção das hidrelétricas. Ele afirma que a construção das usinas irá comprometer a qualidade da água captada pela SAE. Conforme ele, a água represada irá sofrer muitas mudanças químicas, o que comprometerá a qualidade da água. O represamento mudará a coloração da água e a capacidade da mesma de adquirir oxigênio. O Rio Pardo não será mais tão marrom como é hoje, terá águas mais claras, devido à falta de contato constante com o leito do rio. Com tudo isso, deverão ser feitos investimentos para mudar a forma de tratamento que se tem hoje para que se mantenha a qualidade da água bebida pela população. Isso implica em aumento do custo da água do tratamento. Ou seja, água mais cara em nossas torneiras.
Outro questionamento que surgiu foi o das barragens atrasarem o escoamento das águas nos tempos de cheia. Para Santa Cruz pode ser preocupante, pois mais tempo levaria para as águas abaixarem nos pontos que a cidade sempre apresenta alagamentos nestes períodos.
As perguntas são muitas e bastante complexas as suas respostas. E as respostas não podem apenas ter como sustentáculo a necessidade de energia e para o desenvolvimento do país. Temos que ter clareza e discernimento para cobrar também a nossa parte, de nosso quinhão de chão. O desenvolvimento do país também implica no nosso desenvolvimento, não só o econômico, mas também o ambiental e social. E para isso precisamos ter conhecimento dos prós e contras. A partir de um conhecimento amplo temos condições de opinar sobre o assunto. E não aceitar de cabeça baixa como uma imposição.
Como a própria Constituição Federal diz o município é um dos membros da Federação, e nesse campo de discussão está em igualdade de posição com a União e o Estado. Devemos fazer valer esta postura autônoma que temos. Devemos nos munir de informações e cobrar prazo para a nossa decisão. Temos esse direito. E se o tempo não nos for dado, podemos criá-lo com leis municipais, pois temos essa prerrogativa.
Ser a favor ou ser contra é apenas um detalhe. Antes disso temos de ter conhecimento, para depois termos um posicionamento.
Mauricio Araujo
Presidente da Apodesc